"Cansado do sistema" que envolve árbitros no Brasil, Guilherme Ceretta abandona carreira no Brasil e vai para os EUA: "A profissionalização não mudaria muita coisa"
Ceretta apitou duas finais de Paulista. Na foto, a final de 2013 entre o Santos, de Neymar, contra o Corinthians, de Paulinho (Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com)
Já em solo americano, Ceretta aponta, na sua opinião, o que precisa ser mudado na arbitragem brasileira. Para ele, a politicagem, os métodos de treinamento e a falta de critério nas escalas prejudicam o desempenho dos árbitros no país. O árbitro chegou a afirmar que sofreu perseguição dentro da Comissão Nacional de Arbitragem (Conaf) por seguir carreira de modelo enquanto apitava.
– O que mais atrapalha é a política, a profissionalização dos árbitros não mudaria muita coisa. Ter que fazer política com todos os estados, para agradar presidentes de federações é o que atrapalha. É preciso mudar o sistema ou as pessoas. O fato das pessoas estarem acostumadas com esse método, rotina e gerando um clico vicioso faz com que as pessoas sejam submissas. Quem está fora reclama, mas quando entra não faz nada para mudar, isso enoja a arbitragem. É isso que tem que mudar. Vai passar mais 10, 20 anos e continuará igual. Continuarão os erros e a mesma informação se torna um telefone sem fio, se não unificar e deixar menor o número de pessoas para dar informação aos árbitros, tudo continuará assim – explica.
Os números da carreira de Guilherme Ceretta de Lima (Foto: Editoria de Arte)
O estopim para Guilherme Ceretta de Lima desistir da carreira no Brasil aconteceu em outubro do ano passado, quando deixou o quadro nacional de árbitros após ser impedido de participar da escala do Campeonato Brasileiro. No Brasileirão 2015, apitou apenas um jogo: a vitória do Flamengo sobre o Coritiba, válido pela sétima rodada. A não expulsão do atacante Wellington Paulista, que ofendeu o auxiliar Marcelo Van Gasse, resultou em um afastamento temporário. Depois disso, acabou não participando de outros sorteios e se ausentando dos testes físicos e teóricos, critérios para seguir dentro da escala. Para Ceretta, a punição imposta pela CBF foi exagerada, e isso fez com que ele tomasse a atitude de não seguir mais apitando pela entidade.
– Cansei do sistema: é muita prova, reunião, teste físico e blá, blá, blá. Todo mundo quer falar e poucos sabem. Coisas pequenas que em 15 anos enjoam. Eu parei minha carreira no Brasil para tentar alguma coisa nos Estados Unidos, seja como árbitro ou treinador em algum clube. Tem que ser algo relacionado ao futebol, ainda acredito que posso continuar nessa carreira e se as coisas andarem bem por esse lado aqui, a carreira na arbitragem continua – desabafa Ceretta.
Em mais de 15 anos como profissional, ele apitou duas finais do Campeonato Paulista (2013 e 2015), recebeu o prêmio de melhor árbitro do último estadual, além de ser um dos brasileiros aspirantes ao quadro da Fifa. Com promissora carreira, ele lamenta que os problemas fora de campo atrapalhem quem tente seguir na profissão.
– Tive muitos mais acertos do que erros em jogos grandes. Foram 10 anos consecutivos de primeira divisão, não é fácil. Em tantos anos no interior de São Paulo, eu fui o que mais conseguiu ficar e se manter. Tenho duas finais de estadual e é algo que ninguém me tira. Fico triste das coisas não serem resolvidas apenas dentro do campo, se fosse eu teria dobrado esses números – avalia.
Para o árbitro, outro episódio foi fundamental para começar a pensar no futuro da sua carreira. Na decisão do Campeonato Paulista de 2015, Ceretta acabou se envolvendo em confusão após expulsar o atacante Dudu e o meia Geuvânio, após os dois jogadores se desentenderem na entrada da área. Depois de receber o cartão vermelho, em lance com o santista, o atacante do Palmeiras deu um empurrão no juiz antes de seguir para o vestiário.
Denunciado pela agressão no clássico na Vila Belmiro, o jogador foi condenado a 180 dias de suspensão. Após recurso, o atleta teve a pena reduzida para apenas seis jogos, o que causou, na época, revolta no árbitro. Para ele, o episódio prejudicou sua carreira. Ele move processo na Justiça Comum contra o atacante do Palmeiras por conta da agressão na final do Paulistão, vencida pelo Santos.
– A polêmica não foi eu que criei, ele fazer aquilo em uma final que mais de 140 países estavam assistindo, acabou estourando para o lado mais fraco, que sempre é o da arbitragem. Depois daquilo, ele jogar e eu estar apitando seria um atrativo ou uma preocupação, e certamente o episódio atrapalhou. Mas a Justiça agora é quem resolve e vamos ver quem está certo ou errado na história – disse Ceretta.
Guilherme Ceretta de Lima e Dudu, do Palmeiras, foram protagonistas de confusão na final do Paulista 2015 (Foto: Daniel Teixeira/Estadão Conteúdo)
A mudança de Ceretta para os Estados Unidos passa pela busca de qualidade de vida para a família, novas oportunidades profissionais, que inclui a possibilidade de apitar profissionalmente na Major League Soccer (MLS), a Liga de futebol norte-americana. As chances de retorno para o Brasil, segundo ele, são remotas. Enquanto não consegue espaço na arbitragem, Ceretta atua como treinador da escola Brazil Soccer Academy, com sede na Flórida, nas categorias sub-14, 15 e 16, além de ser auxiliar no sub-11, 12 e 13.
– Saí pela porta da frente. Respeito muito a Federação Paulista de Futebol (FPF) e o Cel. Marinho. Se o Ednilson Corona o presidente da Comissão de Arbitragem, ela está em boas mãos, uma pena ele não poder escolher as pessoas ao lado dele e já terem colocado pessoas que não agregam em nada. Estou nos EUA, vou trabalhar com futebol e buscar algo melhor. Fazendo as mesmas coisas vou ter uma qualidade de vida melhor e dar uma segurança maior para a minha família. Me parece que é possível apitar na MLS, mas existe outras ligas que é possível e são nelas que vou começar – explica.
Guilherme Ceretta de Lima: carreira como árbitro, a família e a nova vida nos EUA como treinador (Foto: Arte/ TV TEM)
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